ENTRE CAMPOS... UM OLHAR... UM CAMINHO

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Carta a Angela



Para ti, meu amor, é cada sonho
de todas as palavras que escrever,
cada imagem de luz e de futuro,
cada dia dos dias que viver.

Os abismos das coisas, quem os nega,
se em nós abertos ainda em nós persistem?
Quantas vezes os versos que te dou
na água dos teus olhos é que existem!

Quantas vezes chorando te alcancei
em lágrimas de sombra nos perdemos!
as mesmas que contigo regressei
ao ritmo da vida que escolhemos!

Mais humana da terra dos caminhos
e mais certa, dos erros cometidos,
foste de novo, e sempre, a mão da esperança
nos meus versos errantes e perdidos.

Transpondo os versos vieste à minha vida
e um rio abriu-se onde era areia e dor.
Porque chegaste à hora prometida
aqui te deixo tudo, meu amor!

Carlos de Oliveira, in “Poesias”

sábado, 18 de setembro de 2010

Palavras ditas

Palavras que disseste e já não dizes,
palavras como um sol que me queimava
Olhos loucos de um vento que soprava
em olhos que eram meus, e mais felizes.

Palavras que disseste e que diziam
segredos que eram lentas madrugadas,
promessas imperfeitas, murmuradas
enquanto os nossos beijos permitiam.

Palavras que dizias, sem sentido,
sem as quereres, mas só porque eram elas
que traziam a calma das estrelas
à noite que assomava ao meu ouvido...

Palavras que não dizes, nem são tuas,
que morreram, que em ti já não existem
— que são minhas, só minhas, pois persistem
na memória que arrasto pelas ruas.


Pedro Tamen, in “Tábua das Matérias”

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Recordando jantar no El Rancho e a união e alegria que o Benfica nos dá!


Não. Não vou retomar o assunto Prof. Carlos Queiroz, embora se conheçam (?) agora as «razões» que a Federação Portuguesa de Futebol do Dias apresentou para o seu saneamento. Claro que as mesmas suscitam-me algumas considerações que posteriormente apresentarei.

Relembro hoje um jantar no restaurante El Rancho, em Albufeira. Quando perguntei ao funcionário que me recebeu se tinha mesa disponível para quatro pessoas, ele hesitou. Mas tal hesitação rapidamente se desvaneceu quando referi que pretendia também ver na televisão o Nacional da Madeira a ganhar ao slb. Ele, sportinguista de coração, também perfilha os meus interesses quanto aos resultados do clube da segunda circular. Durante o jantar fomos mantendo um interessante diálogo, reforçado pela alegria dos dois golos do Nacional da Madeira.

Claro que no final do jogo não me poderia esquecer do velho slogan que se aplica nestes casos:


O que é Nacional é bom.

E depois ainda me fui lembrar da massa da marca Nacional. Fui então presenteado com um pacote de massa que ainda guardo - e guardarei - como recordação deste momento. Espero agora que não tenha que comer a massa da Nacional no próximo jogo...

Entretanto, o diligente e simpático funcionário do El Rancho apresentou-me também um senhor que media certamente mais de dois metros. Como podem verificar, eu deveria ter ido buscar a lista telefónica para ficar melhor na fotografia. Mas lá estava o pacote da massa. Claro que o denominador comum aos três era a alegria que o Benfica nos tinha acabado de dar. Para além disso, ainda foi chamado um portista que visita por vezes o estádio do Dragão e com ele também foi possível trocar algumas palavras.

E assim, pelo futebol, se conhecem pessoas. Nele, e por ele, tenho feito alguns amigos.

O que escrevi torna patente uma dimensão ontológica do desporto que merece uma reflexão mais completa e à qual aqui voltarei.

sábado, 11 de setembro de 2010

AI PORTUGAL ... NÃO TE DEIXES ASSIM VESTIR


Ficamos agora a saber pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros que os recentes acontecimentos relativos à selecção portuguesa de futebol não são bons para a imagem do país.

Obrigado Sr. Ministro pelo alerta.
Por acaso não tínhamos reparado nisso... de tão difícil que era perceber tal enigma.
Mas vá então falar com o seu colega de Governo, Sr. Secretário de Estado da Juventude e o Desporto, bem como com a Federação Portuguesa de Futebol.

O primeiro descobriu, já passado o Mundial, que os factos relativos ao Prof. Carlos Queiroz eram graves. Depois não teve qualquer problema com a imagem de Portugal quando mandou o «recado» à direcção da Federação Portuguesa de Futebol quanto ao que deveria ser a liderança e sobre o que esta deveria ter feito. Depois de «atirar a pedra» remeteu-se ao silêncio ensurdecedor.

Agora temos uma Federação que despede o treinador afirmando justa causa para tal e insinuando uma diminuição de resultados. Certamente deve ter sido o treinador o responsável por um falhanço inacreditável do guarda-redes da Noruega ou pela fraca prestação defensiva da equipa em Guimarães. Foi o Prof. Carlos Queiroz o culpado da lesão de Cristiano Ronaldo que, à semelhança de muitas lesões de muitos jogadores no passado, o impediu apenas de jogar pela selecção, mas com recuperação milagrosa garantida para o próximo jogo do clube. Na verdade, os jogadores vão dando grande demonstração da sua Portugalidade e amor à causa.. enquanto são titulares Quando tal não acontece, mandam logo a cartinha a porem-se ao «fresco». Gerem os seus próprios interesses...

O Conselho de Disciplina da Federação impede, pela aplicação de um castigo desproporcional, que o treinador oriente a equipa. Depois vem alguém agravar o castigo, julgando em causa própria e deitando para o caixote do lixo a decisão de juristas. E a Federação, «servindo-se» de um castigo que contraria uma decisão de um dos seus próprios órgãos, perde o respeito por si própria e despede o treinador.

A imagem de Portugal sai afectada, mas não apenas por este processo kafkiano. A imagem de Portugal fica marcada pelos já habituais ínvios atalhos onde «os chicos espertos» aproveitam uma pena desajustada e que transforma, como escreveu Foucault, o prevaricador em vítima, para «chutar» para as calendas dos tribunais o pagamento do «papelinho» que eles próprios acordaram escrever no contrato. E assim se faz um saneamento, mas ao contrário. Não como os do P.R.E.C.

E assim se perde um projecto, em detrimento do imediatismo resultadista sempre dependente da bola no poste ou do árbitro.

É por estas assim que o grande escritor Jorge de Sena sublinhou a cultura necrófila de Portugal. Na verdade, sofremos mesmo de uma autofagia que nos arruína. Por isso me recordo agora de alguns versos da conhecida canção de Sérgio Godinho Não te deixes assim vestir, do já antigo disco intitulado Coincidências.

Ai Portugal. Dar-te conselhos é bem pouco original
Mas se realmente não quiseres querer-te mal
Olha para ti ó Portugal e não te deixes assim vestir
É que há coletes que são de força
Por mais que o digam não ser.
E há casacas feitas já para se virar
por mais que o digam não ser.
Assim como há botas difíceis de descalçar
por mais que o tentem não ser.
E há coturnos que eu diria «são soturnos»
por mais que o tentem não ser.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Despedimento kafkiano do Prof. Carlos Queiroz


O despedimento do Prof. Carlos Queiroz é mais uma página totalmente kafkiana do futebol português. Esta referência ao autor checo é polissémica e vou explicar porquê. Lembro-me de Kafka porque, à semelhança da sua obra O Processo, estamos também perante um procedimento absolutamente iníquo, novelístico e canhestro. Também me lembro de Kafka porque neste processo encontramos um miserabilismo idêntico ao que encontramos na sua Matamorfose.

Ao que tudo indica, o treinador nacional terá recorrido a termos insultuosos durante os diálogo que estabeleceu com os técnicos que iriam fazer o controlo anti-doping aos jogadores de Portugal. O próprio reconheceu publicamente que foi deselegante e as palavras, se de facto foram proferidas, merecem a reprovação de todos.

No entanto, se os factos têm a gravidade agora atribuída, porque razão o Prof. Carlos Queiroz não foi de imediato suspenso de toda a actividade e sujeito ao competente processo disciplinar? Tal não sucedeu, porque simplesmente teria sido perturbada a preparação para o Mundial de Futebol, bem como o desempenho da selecção nesta competição. Mas outra pergunta subsiste: se Portugal tivesse conseguido um resultado de excelência, o professor estaria hoje a ser despedido?

O Sr. Luis Horta poderia sempre, caso estivesse ofendido com as palavras proferidas, instaurar um processo-crime ao treinador português. Mas assistimos a um processo maquiavélico em que uma entidade julgou em causa própria e contrariou a decisão anterior do Conselho de Disciplina - composto por juristas - que considerou não ter sido levantado qualquer obstáculo à realização do controlo anti-doping.

De qualquer forma, foi assim criado o alibí para que se cumprisse o desejo do Laurentino. Para além de reputar de graves os factos ocorridos, mesmo antes de o Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol se ter pronunciado sobre eles, o Estado do Secretário da Política no Desporto não se coibiu de «aconselhar» implicitamente a Federação Portuguesa de Futebol a fazer, precisamente, o que fez hoje. Deve ser aquela coisa da «política de influência». O presidente desta instituição, mais uma vez sem coragem, não foi capaz de dizer publicamente que não recebia recados de ninguém (assim sendo, parece que recebe), que na casa dele mandava ele ou então que não admitia interferências.

E assim se faz Portugal. Uma instituição que assinou livremente um contrato com um treinador que tem e deu a Portugal dois campeonatos do mundo de juniores e que formou jogadores que possibilitaram grande sucesso a outros, despede assim um treinador, escapando, para já, às indemnizações previstas no contrato acordado. Assim se atira para os tribunais e para daqui a alguns anos uma eventual obrigação de pagamento das mesmas. Por agora despede-se, lava-se as mãos e varre-se o «lixo» para debaixo do tapete. Será aquela outra coisa a que alguém resolveu chamar de «razão atendível» que já está a funcionar?

Depois, quem dirigir a federação na altura, que pague a conta... ou feche a porta.

E asim se perde um projecto de restabecimento do futebol juvenil e as consequentes vantagens que poderiam advir para o futuro na própria selecção nacional. Portugal não merece o trabalho do Prof. Carlos Queiroz.

É por estas e por muitas outras que Mourinho afirmou claramente que não quer trabalhar e nem sequer viver neste país.

sábado, 4 de setembro de 2010

Uma breve reflexão que vos deixo


Tivemos oportunidade de ouvir os mais diversos comentários sobre os dados do Eurostat sobre o desemprego em Portugal e a divergência dos mesmos perante os números apresentados pelo Instituto Nacional de Estatística.

Sublinhe-se que se discutia uma divergência de décimas. Mais uma vez, governo e oposição esgrimiam os mesmos argumentos de sempre. O primeiro colocou em causa os dados revelados enquanto os elementos dos partidos de oposição sublinhavam a gravidade da situação.

Eu preferia ouvir propostas e medidas concretas e concretizáveis para que o desemprego diminuísse. Importa lembrar que aos números correspondem famílias e crianças que sofrem amargamente este drama.

Surgiram entretanto os fortes protestos do povo moçambicano perante aumentos que consideram incomportáveis para as suas já paupérrimas condições de vida. Este tipo de protesto deveria, a meu ver, constituir um sinal do que pode surgir no futuro.

Todavia, os políticos preferem trabalhar para ganhar eleições. Apenas alguns procuram soluções e são menos ainda os Homens de Estado que pensam nas próximas gerações.
Seria conveniente que se recordassem das seguintes palavras do poeta António Aleixo.


Vós que lá do vosso Império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
qu'rer um Mundo novo a sério.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

O Porto aqui tão perto


Regressei à cidade do Porto.

É sempre aquela sensação de «entrar em casa». Guardo em mim a imagem da entrada na cidade pela Ponte da Arrábida. Temos à direita a nova e a velha cidade. À esquerda a Foz, o mar e a Afurada.

Perante este belo «quadro», recordo sempre as palavras do saudoso poeta David Mourão Ferreira quando, sobre outra cidade, escreveu: «Dela por vezes me evado, mas sempre a ela regresso. Bem sei eu que não desato os cordões com que me aperta.»

Este é também o meu sentimento no regresso à minha cidade. Curiosamente, vivi esta pertença nas férias quando ouvi as palavras de Rui Veloso no excelente concerto que deu na Fatacil. Na nossa pronúncia do norte - muito acentuada nele - perguntou: «Quem é que aqui é do Porto?»

Muitos foram aqueles que se manifestaram. Eu também (Rui Veloso é dos poucos que me consegue «pôr a mexer» - e pôs - num concerto). Com tantos portuenses a assistir, foi interessante a analogia do cantor:

«Somos como os chineses carago. Somos muitos e estamos em todo o lado.»

Pois é. Somos muitos e estamos em todo o lado. Nem que seja em espírito.

Como refere o último guia distribuído pelo jornal Expresso, «O Porto é um estado de espírito.»

É por isso que, tomando as palavras de uma canção de Sérgio Godinho - outro cantor portuense - podemos estar quase mortos no deserto ... mas temos o Porto aqui tão perto.

É este estado de espírito que vence o esquecimento; e foi este o tema da canção que se seguiu às palavras do cantor.

http://www.youtube.com/watch?v=Wy2wkORpplM



Esta canção assumiu, para mim, um significado muito pessoal nos dias que correm.








sábado, 31 de julho de 2010

Os homens que partem e a Arte e os artistas que ficam


Conjugando o que aqui escrevi sobre Paulo Portas, bem como a singela referência à Lolinha e ao actor António Feio, recordei a morte de José Saramago.

A morte deste escritor português, consagrado e exaltado com o Prémio Nobel da Literatura, não deixou de suscitar os mais diversos comentários. Enquanto uns elogiaram a sua obra literária - e sobre esta a atribuição do Prémio Nobel tudo disse - outros optaram por remexer no passado de José Saramago. Lembraram a carreira no jornal Diário de Notícias para fazer críticas ao carácter do homem. Por sua vez, o Vaticano, certamente legitimado pelo passado impoluto de respeito pelo direitos humanos de que a Igreja Católica se pode orgulhar, optou também pela crítica às posições ideológicas do escritor, sobretudo no que diz respeito à religião e ao comunismo. Considerando as posições públicas de Saramago sobre estas duas grandes problmáticas da Humanidade, não é surpreendente que tal tenha acontecido. Afinal, quem se expõe publicamente legitima também críticas públicas.

Todavia, o prestigio de José Saramago não surgiu em consequência de tais posições, mas sim da sua escrita. E as honras dispensadas decorreram disso mesmo e do facto de ter honrado Portugal com o Prémio Nobel.

Assim sendo, o tempo da sua morte deveria ser o tempo de recordação do escritor e celebração da obra que o mesmo nos deixou. Não o tempo das questões pessoais e dos ataques ao carácter. Porém, alguns deixaram que estas se sobrepusessem ao reconhecimento de uma obra literária notável de um autor que promoveu Portugal e a língua portuguesa e a quem o país deveria estar agradecido. Nem mesmo o representante máximo da nação se mostrou capaz de tomar esta atitude sensata. Agora, também na minha cidade do Porto forças se levantam para impedir que o nome do Prémio Nobel da Literatura seja atribuído a uma rua.

Mas não são estas atitudes que fazem esquecer os livros de Saramago e as personagens que ele criou e que «habitaram» os dias e a memória dos leitores.

O meu contacto pessoal com José Saramago limitou-se apenas a um autógrafo na obra História do Cerco de Lisboa. Valorizo sobretudo a sua obra e a influência da mesma nos meus dias. Sobre o seu carácter, quem for perfeito que lhe atire a primeira pedra...

E assim se consegue perceber o lamento pela morte de pessoas que nunca conhecemos, mas que «entram» nas nossas vidas pelo seu trabalho artístico e difusão do mesmo. Por isso lamentamos também com emoção o desaparecimento de António Feio e o guardaremos na memória.

Na verdade, não nos conseguimos aproximar da Arte sem «morrermos» também um pouco perante ela.

sexta-feira, 30 de julho de 2010



‎APROVEITEM A VIDA E AJUDEM-SE UNS AOS OUTROS.


APRECIEM CADA MOMENTO.


AGRADEÇAM.


E NÃO DEIXEM NADA POR DIZER. NADA POR FAZER.




ANTÓNIO FEIO

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Lolinha


Estava hoje pela manhã no meu local de trabalho quando recebi a sms que comunicava que a Lolinha tinha falecido.

Conheci a Lolinha na casa de uma amiga. Vi-a duas vezes e dela recordo, sobretudo, o seu sonoro riso. Parece que a estou a ver sentada no sofá frente à televisão. A Lolinha era a irmã de uma amiga a quem manifestei a minha estranheza pelo inesperado desenlace, até porque ainda na passada segunda-feira falei com ela telefonicamente e nada me foi dito sobre qualquer tipo de doença da sua irmã.

Soube que a Lolinha faleceu rapidamente vítima de engasgamento enquanto tomava o seu leite ao pequeno almoço. E assim se perde a vida. Por isso lembrei-me de imediato destas sábias palavras que Tiago nos deixou na sua epístola: «Digo-vos que não sabeis o que acontecerá amanhã. Porque o que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e logo se desvanece.» (Tiago, 4: 15)

É por isso que tudo se pode perder num momento. Recordo, por isso, a parábola que Jesus apresentou aos que o ouviam acerca de um homem rico. Este, considerando a sua riqueza, dizia para si mesmo: «Alma; tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e folga.» Mas Deus disse-lhe: «Louco! Esta noite te pedirão a tua Alma; e o que tens preparado para quem será?» Assim é aquele que para si ajunta tesouros e não é rico para com Deus. (Lucas, 12: 20-21)



De que vale ganhar todas as riquezas e perder a Alma?

A propósito das primeiras gostaria que o caro leitor soubesse que a Lolinha nunca teve a plenitude das faculdades mentais que a generalidade das pessoas tem. Por isso nunca trabalhou e, consequentemente, também não contribuiu para a Segurança Social. Não obstante a Declaração Universal dos Direitos do Homem afirmar que todos os homens são iguais, e apesar da Lolinha não ter tido culpa de não trabalhar, é esta ausência de descontos a razão pela qual não terá direito ao mesmo valor de subsídio de funeral que a generalidade dos cidadãos portugueses pode receber.


Paz à sua Alma e que descanse finalmente em paz.



segunda-feira, 19 de julho de 2010

As «Portas» do Paulo

Considerando o que escrevi sobre o debate acerca do estado da nação, seria de esperar que a proposta de coligação apresentada por Paulo Portas fosse do meu inteiro agrado. Na verdade, e como princípio estruturante de um futuro governo, poderia até ser proveitoso para o pais uma coligação entre o Partido Socialista, o Partido Social Democrata e o Centro Democrático Social/Partido Popular. Se tal coligação fosse conducente ao primado da eficácia das políticas a implementar para o benefício de Portugal, em detrimento dos interesses estratégicos dos partidos políticos para aceder ao poder e também dos membros carreiristas que os compõem, poderíamos, eventualmente, ter encontrado um caminho para ajudar a resolver os problemas dos portugueses.
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Porém, Paulo Portas foi bem claro. A condição sine quoi non para que tal coligação se pudesse concretizar era o afastamento total de José Sócrates do governo. A informação publicada pelo jornal Expresso sobre a tentativa falhada de acordo, não apenas parlamentar, mas mesmo de governação, entre Portas e Sócrates, bem como a desconfiança pessoal que supostamente, e a fazer fé na notícia mencionada, existe entre os dois, ajuda a compreender tal posicionamento do líder do C.D.S./P.P.
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O problema é que tal proposta deixa claro que Portas sobrepôs as questões pessoais às ideias. A condição sine quoi non, na minha perspectiva, deveria ser a configuração resultante das medidas e políticas propostas e não a pessoa que a propõe. Todavia, para Portas, parece que assim não é. Prefere-se discutir pessoas e não tanto ideias. Talvez seja esta a razão pela qual as alianças políticas e coligações onde Paulo Portas tem participado têm-se pautado por grande consistência e perenidade... ou seja... nenhuma.
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Mas tornar o problema uma questão pessoal - como Nobre Guedes referiu em entrevista na última edição do jornal Expresso - não são o único demérito da proposta efectuada. Eu percebo que no seu narcisismo e auto-contemplação Portas tenha visto na proposta a oportunidade de se apresentar preocupado com o país e pró-activo na procura de soluções para os problemas do mesmo. Entendo também que assim tenha surgido um novo tema para comentar e um novo cenário para traçar. Todavia, parece ser necessário lembrar que José Sócrates ganhou as eleições e, por conseguinte, é primeiro-ministro por vontade do povo português.
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Neste país há muitos que querem ganhar jogos na secretaria. Esta proposta não deixa de ser uma tentativa de Portas chegar ao governo, sem que o povo português que lhe tenha conferido nas urnas tal mandato.
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Já foi assim que Portas chegou a ministro. Por escolha do líder de outro partido; esse sim; vitorioso em eleições e, portanto, sufragado pelos portugueses. Estes votaram no P.S.D. liderado por Durão Barroso e depois, no mesmo «pacote», acabou por vir também Paulo Portas. E assim seria de novo.
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Pelos vistos, quem tanto critica o «Rendimento Mínimo», quer receber o «Rendimento Político Máximo», chegando a ministro por «Portas» travessas e sem a confiança do voto popular. Mais proveitoso seria trabalhar para apresentar propostas que levem os portugueses a conferir ao partido e respectivo líder a legitimidade para governar.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

O debate do Estado da Nação


Passou o campeonato do mundo que nos trouxe alguma evasão de um quotidiano difícil para os portugueses e do qual estamos bem conscientes. A realidade nunca nos permitiria esquecer tal, por muito que alguns que percebem pouco de futebol continuem a insistir que tal jogo distrai a consciência das pessoas para os problemas sérios, mesmo que estes entrem pela casa dentro nos dias que correm.
Regressamos, agora, ao país real. E supostamente seria esse que se discutiria, hoje, no debate relativo ao Estado da Nação que decorreu na Assembleia da República. Todavia, tal como esperado, o debate evidenciou mais do mesmo.

Pretendo com isto dizer que não vislumbrei a honestidade intelectual que entendo como fundamental para avançar na resolução dos problemas do país. Sobressaíram percepções muito diferentes da realidade. De um lado o governo e partido que o apoia. Não obstante reconhecerem os tempos difíceis, consideraram haver bons indicadores para o futuro e foram elogiadas as medidas do governo. Ao invés, dos outros partidos, emergiu uma visão escatológica sobre o estado do país, realçando a situação muito dificil em que o mesmo se encontra do ponto de vista económico, financeiro e social.

Eu entendo que possam haver perspectivas diferentes sobre a realidade portuguesa. É normal. Paul Watzlavik destacou isso mesmo quando escreveu a obra A realidade é real? Mas é lamentável que sobre uma coisa tão séria como a situação do pais haja tal discrepância, sendo que o extremismo das duas posições descredibilize ambas as partes. Foi mesmo ridículo assistir ao esgrimir de argumentos em torno dos números do Instituto Nacional de Estatística e ao acenar de folhas de papel das bancadas. O relatório diz o que diz, ainda que uns vejam a garrafa meio cheia e outros olhem para ela como meio vazia.

Para a descredibilização de algo tão nobre como a política contribui também a forma como se fala no parlamento português. É triste ver que se dá mais importância ao tom comicieiro e gongórico, do que propriamente à força dos argumentos e à validade, pertinência e exequibilidade das propostas. Creio que assim é, porque, na verdade, estas últimas são muito poucas. Se nada há para propor, ao menos que se grite. Pode ser que disfarçe o debate e a política pueril que se faz neste Portugal.

E assim vai correndo o campeonato da política portuguesa, com as equipas - talvez «agências de emprego»? - a posicinarem-se para tentar ganhar as próximas eleições, para aceder ao poder e tão desejados cargos. Uns têm muito verbo, porque não têm que apresentar a verba e falam com a irresponsabilidade de quem não tem que pagar as facturas das medidas propostas. Outros dificilmente reconhecem os seus erros. E ainda há aqueles que são rabo escondido com gato de fora - não; não me enganei - quanto o que propõem relativamente ao futuro de conquistas civilizacionais que importa preservar, ainda que para tal sejam precisas reformas.

E é essa a diferença. São muitos os políticos que gerem o partido e suas carreiras com vista às próximas eleições. São poucos os homens de Estado que fazem política a pensar no futuro das nações.

Para quando um contrato social e político em que a pequena estratégia político-partidária dê lugar a um conjunto de pessoas de reconhecida capacidade e competência para que, enfim, se chegue a um consenso sobre as medidas necessárias e ainda sobre a melhor forma de implementação das mesmas?


O tempo urge e os portugueses esperam. E quem espera desespera...

domingo, 11 de julho de 2010

Terminou o mundial. Que persista a festa do futebol


Parabéns a Espanha que se sagrou, hoje, campeã do mundo.
Numa final que não proporcionou um grande espectáculo de futebol bem jogado - e não tinha que proporcionar porque se decidia, num jogo, um campeonato do mundo - podemos ver um jogo emocionalmente intenso, com duas equipas muito concentradas e tacticamente equilibradas. Como se previa, foi a Holanda que conseguiu criar mais dificuldades à Espanha. Mas obviamente que pudemos assistir a um jogo com grande interesse.

Para além da final, fica sobretudo um Mundial na África do Sul. Como em todos os mundiais, fico com uma certa tristeza quando esta competição termina. Foram muitos jogos de futebol e um calendário dos mesmos que nas últimas semanas me condicionou um pouco o quotidiano.

Nesta final, não consigo deixar de olhar para um mundial como um belo exemplo de encontro de países num palco desportivo. É neste, através das cores nacionais e dos hinos, que por vezes melhor se emblematiza uma nação e se concretiza também, da forma mais intensa, um sentimento de pertença à mesma. Na tensão do jogo que decorre do seu carácter agonístico, os adeptos unem-se, qual «comunidade imaginada», no apoio aos que representam a nação no relvado.

Mas apesar do antagonismo inerente ao jogo, é importante sublinhar que este não deixa também de se constituir num elemento universal da cultura humana; quase talvez uma «linguagem» que todo o mundo entende. Apesar das diferenças, há um jogo que a todos une. Por isso realço o simbolismo que esta congregação de nações poderá assumir na África do Sul, onde se espera também que, apesar das diferenças, prevaleça o Homem. É esta a lição de Mandela. Por tudo o que ele representa para a nação e para o mundo, foi bonito vê-lo presente no local onde outrora discursou.

Sei bem que o futebol, qual deus janus, contém, in nuce, o que há de melhor e do pior. Mas este é o momento para mostrar a sua humanidade e a sua universalidade. Viva o futebol.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Uma pergunta sobre o Campeonato do Mundo


Volto agora a escrever acerca da prestação da selecção portuguesa no mundial da África do Sul. Faço-o só agora precisamente porque sinto necessidade de tempo para formular uma opinião sensata. Evito assim os impulsos emocionais vividos na sequência do jogo e após o mesmo. E depois, como se viu, o tempo, esse grande mestre, acaba por revelar muito.

Tenho ainda a vantagem de não seguir a linha dos discursos dos treinadores de segunda-feira (o melhor deles talvez seja João Gobern) que proliferam logo após as partidas e nos dias posteriores às mesmas. Estou plenamente convencido de que muitos desses discursos já não são sobre o jogo, mas sobre os discursos sobre o jogo. E estes, são tão previsíveis, que me fazem lembrar Michel Foucault quando, na sua obra intitulada A ordem do Discurso, nos escreve acerca dos discursos que foram ditos, permanecem ditos, são ditos e serão ditos. Estou persuadido que o mesmo se passa quando muitos falam sobre futebol.

É por isso que não me quero atrever a discutir tácticas e substituições. Sobre as primeiras, aconselho o caro leitor(a) a abrir os cordões à bolsa e a assistir a um congresso no qual os treinadores de futebol consagrados apresentem comunicações sobre tácticas. Experimentem. Por mim, confesso que me senti um ignorante. Eles discutem dinâmicas e pormenores, enquanto os intelectuais de bancada andam a (des)conversar sobre o 4-4-2, o 4-3-3, o 4-2-3-1, o 3-5-1 ou até, na nova criação do jornalista Nuno Luz, da SIC, que numa entrada em directo da Covilhã reportou-se ao 4-4-3 da selecção portuguesa. Fala-se disto, como se o futebol fosse um jogo de matraquilhos em que os jogadores se mantêm fixos nestes esquemas por um varão. Sobre as substituições, podemos concordar ou não. Todavia, é mais fácil comentar depois de sabermos se as mesmas resultaram ou falharam. É como acertar nos números do Euromilhões, depois dos mesmos já terem sido sorteados.

Verificamos agora, a poucas horas do jogo decisivo deste campeonato do mundo, que Portugal foi eliminado por uma selecção que marca presença na final e que muitos consideram mesmo a favorita para a vitória. Se tivermos em conta os jogos que a Espanha disputou após ter eliminado Portugal, verificamos que a selecção espanhola se impôs sempre aos seus adversários com o mesmo estilo de jogo com que derrotou Portugal, sendo que nenhuma selecção foi capaz de a contrariar de forma eficaz.

Por isso mesmo, deixo algumas questões simples: Encontramos no jogo efectuado pelo Paraguai e pela Alemanha contra a Espanha um desempenho assim tão superior ao que Portugal apresentou diante do mesmo adversário? Criaram tantas oportunidades de golo como Portugal criou até sofrer o golo? Chegaram a equilibrar o jogo como Portugal o fez durante alguns períodos do jogo?

Reconheço que o jogo «terminou» após o golo sofrido e a selecção portuguesa foi completamente incapaz de reagir com a resiliência e a intensidade necessárias. Sei também que não há jogos iguais e que estes dificilmente se podem comparar. Mas uma pergunta persiste: alguém fez, em jogo contra a Espanha, muito melhor do que Portugal?

Talvez a Suíça, porque ganhou.

Mas foi eliminada na fase de grupos. Portugal não.

Saudações

quinta-feira, 24 de junho de 2010

QUE PORTUGAL VENÇA POR NÓS


No programa que a RTP N transmite todas as noites sobre o campeonato do mundo pude ouvir hoje o Professor Júlio Machado Vaz, a propósito dos resultados desportivos de Portugal, a evocar - e digo agora eu - a euforia de vitória que não cabe em nós e a depressão da derrota muito associada a uma idealização negativa de Portugal.

A selecção nacional de futebol é, na actualidade, uma das formas mais notórias de emblematização do país, visível pela exibição e exaltação da sua bandeira, das suas cores e do seu hino. Em torno de um jogo de futebol, e na unidade de espaço e/ou tempo que configura um evento emocional, milhares de pessoas, com as suas histórias e dramas pessoais, congregam-se no apoio a uma causa comum.

Na verdade, dos jogos emergem vencedores e vencidos, com a consequente hierarquia simbólica que isso proporciona. Todavia, o futebol é bem mais que um simples jogo. Qualquer equipa insere-se num contexto histórico, político e social, emblematizando identidades locais, regionais, empresariais e, no caso concreto das selecções, identidades nacionais.

E são nestas que nos revemos e pertencemos. Desejar a vitória do nosso país é, por isso, desejar também a nossa vitória. Há, por isso, uma identificação projectiva quando desejamos a vitória do nosso país. A Psicologia salientou o efeito Basking in reflected glory. Este reporta-se à tendência das pessoas em procurar evidenciar a sua ligação, pertença e associação ao sucesso e, consequentemente, às equipas vencedoras. Assim se compreende que o resultado obtido frente à Coreia do Norte tenha proporcionado aos portugueses um orgulho de Portugalidade que, em alguns, sonha mesmo golear o Brasil.

E assim, qual pêndulo que num movimento rapidamente oscilante passa de um extremo ao outro, se remete para a gaveta do esquecimento contingente o rol de críticas (voltarão quando Portugal perder) que muitos, sem evidente conhecimento para tal, zurziram contra a selecção portuguesa, colocando em causa, a meu ver injustamente, o trabalho de muitos. Estou convencido de que encontramos aqui o contrário ao que anteriormente referi, tendo também a Psicologia classificado este como sendo o efeito Cutting off reflected glory. Como estratégia de diferenciação e afastamento da derrota e do consequente insucesso, os que outrora gritavam as glórias futuras da selecção portuguesa, optarão por preservar a sua imagem social dissociando-se da equipa portuguesa através da depreciação.
Assim sendo, quando Portugal ganha, sentimos também que a vitória é nossa e que contribuímos para a mesma com o nosso apoio. Pelo menos temos essa ilusão. Ao invés, não conseguimos «viver» a derrota sem «morrer um pouco»...

Olhando para este grande ritual que celebra e exalta um sentimento de pertença, estou plenamente convicto de que, para além da contingência de um resultado de um jogo, deve prevalecer o afecto presente na interacção com outros portugueses que perfilham o mesmo desejo de vitória e as mesmas emoções, num reforço, pelo espectáculo futebolístico, de uma comunidade imaginada que, pela diáspora, não tem fronteiras e partilha uma mesma língua e uma memória colectiva.

Pena é que esta intensa solidariedade emocional e afectiva esteja tão esquecida num quotidiano em que a desigualdade e injustiça social faz muitos vencidos... e sempre os mesmos vencedores.

terça-feira, 15 de junho de 2010

A VERDADE DA SELECÇÃO PORTUGUESA


Está feito o primeiro jogo de Portugal no campeonato do mundo da África do Sul e a «verdade do relvado» imperou. Como eu esperava.

E assim esvaziou-se em muitos o balão de uma euforia que, a meu ver, não decorre de nenhum dado muito consistente e com alguma objectividade que a possa suportar. Todos sabemos que a selecção portuguesa é composta por jogadores de nível mundial. Alguns deles competem mesmo nos melhores campeonatos do mundo. Porém, se é certo que nos jogos de preparação a selecção portuguesa relevou alguma evolução, também não parece ser menos verdade que não se tornou patente um colectivo suficientemente coordenado para nos dar a garantia de um bom desempenho da equipa portuguesa enquanto tal. E jogadores de grande nível também os tem a Costa do Marfim. Todos eles jogam em países estrangeiros e alguns deles nos grandes clubes europeus.

Tal euforia existe porque se criou um folclore em torno da selecção portuguesa que tem sido promovido até à náusea pelas televisões, com entrevistas a muitas pessoas. Muitas limitam-se apenas a ditar a ilusória sentença da vitória de Portugal, alvitrando, logo de seguida, os mais variados e inúteis palpites quanto ao resultado do jogo e aos marcadores dos golos.

Por mim, continuo a perfilhar a posição que todos atribuem a João Pinto (ex-capitão do Futebol Clube do Porto), mas que anteriormente tinha já sido enunciada por Churchill, e que todos conhecem; ou seja; prognósticos só no fim do jogo.

Com todo este folclore, para além das televisões conseguirem as desejadas audiências que visam captar a tão necessária publicidade, insuficiente para manter tantos canais, enche-se o balão da euforia, apenas porque sim, ou então porque esta alimenta e exalta um estado de alma de que os portugueses tanto necessitam nestes tempos cinzentos.

O jogo trouxe-nos a verdade. A Costa do Marfim, afinal, não era a equipa fraca que muitos esperavam; mas que aqueles que vêm futebol com regularidade sabiam não ser. A qualidade dos jogadores marfinenses foi potenciada com a construção de uma equipa por parte do seu competente treinador Erikson. E foi como equipa que a Costa do Marfim se opôs ao futebol português. Com as linhas bem juntas e «encurtando» o campo, desapareceu o espaço para a técnica e criatividade dos jogadores portugueses. Para além disso, sobre Deco e Ronaldo houve uma vigilância apertada sempre que os mesmos recebiam a bola, o que criou ainda mais dificuldades ao jogo português. Portugal não teve engenho, arte e criatividade (a falta de Nani) para ultrapassar as dificuldades criadas pela equipa adversária.

Outra verdade reside no facto de a equipa portuguesa, por sua vez, não ter também conferido grandes veleidades ao ataque da equipa adversária. O baixíssimo número de remates à baliza, bem como a percentagem de posse de bola equitativamente repartida em 50%/50%, demonstram claramente que assistimos a um jogo de soma nula, que neste caso concreto assume mesmo um sentido literal, denotativo. Assim sendo, foi feliz o título do jornal francês L'Equipe. Para este, o medo de perder não deixou ganhar.

Não vou pelo discurso dos milhares de treinadores de bancada que acertam sempre na táctica à segunda-feira. São os treinadores das equipas que conhecem melhor os jogadores e o seu estado de forma. São eles que, na verdade, sabem mais de futebol - por conhecimento efectivo e por prática prfissional - e discutem-no a um nível muito superior a todos nós, inclusive comentadores.

Já ouvi muitas opiniões, até sobre a necessidade de Portugal ter arriscado mais para ganhar o jogo. Compreendo, mas talvez agora estivesse aqui a lamentar uma derrota. O que é facto é que, na segunda parte, o jogo ganhou uma nova dinâmica e uma velocidade crescente. Curiosamente, foi nesta fase que Portugal correu mais riscos e que a Costa do Marfim chegou com mais perigo à baliza de Eduardo. Cheguei mesmo a temer que o jogo ficasse «partido» e então a rapidez e a força da equipa africana poderia ter sido letal.

Sei que fica um sabor amargo a «ferro». O remate de Cristiano Ronaldo poderia mudar tudo. Mas a verdade é que um remate ao poste, como diria o Mestre Pedroto, é um mau remate. Em caso algum pode entrar na baliza, mesmo que esta não tenha guarda-redes, porque não leva a direcção certa. É o menos mau de todos os remates falhados.

Não ganhamos. Mas contra aquela que será talvez a equipa que concorrerá com Portugal por um dos lugares do apuramento, perder seria o fim. E o calendário de jogos até nos poderá favorecer. Mas isso veremos...

Da mesma forma que não entrei em euforias delirantes, não entro agora na letargia depressiva da esperança perdida, quando tudo é ainda possível e os sonhos que o futebol nos proporciona ainda permanecem. Por isso nos apaixonamos por ele.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

PELO FUTEBOL



A transcrição de uma notícia do jornal «A Bola» que apresentei nas últimas entradas do meu blogue em nada concorre para a promoção deste jogo maravilhoso que é o futebol e tenho plena consciência disso. Mas como ficou claramente explícito, as mesmas tiveram apenas o objectivo de evidenciar quão pueris são os moralistas de pacotilha que se apressam a apontar supostas práticas corruptas, amorais e indignas, sendo, portanto, as mesmas passíveis de configurar e monumentalizar no adversário vitorioso o supremo opróbrio.

Pena é que tal solicitude em ver o argueiro no olho do outro tem impedido muitos, durante vários anos, de ver a trave que persiste nas suas vistas, curtas. Ou será que estarei enganado e é mesmo uma questão de incapacidade? Às vezes desconfio até que estaremos perante um signo a ser interpretado na ordem do sintoma perante a frustração. Mas eles continuam, no seu delírio de virtude pública, mas vício privado, a mostrarem-se como sepúlcros caiados. Mas esses são a espuma dos dias que desaparece com a torrente da história.

Parafraseando um verso de Miguel Torga, sei que o futebol reproduz o bom e o mau que vão ao leme da nau nesta deriva em que vamos, hoje, no mundo actual. No entanto, o campeonato do mundo que agora decorre é o expoente máximo deste jogo como linguagem universal. E o acto lúdico, como demonstrou Huizinga, é verdadeiramente fundador da cultura, da sociedade, em suma, da condição humana.

É a beleza do futebol que me apaixona. A dimensão socio-cultural e política deste jogo que se dá agora em espectáculo numa manifestação universal que congrega em torno de uma bola o relativismo de diferentes nacionalidades, línguas, credos, riquezas, enfim, de diferentes culturas e sociedades, será, pois, tema dos meus próximos pensamentos aqui no meu blogue.

Espero que se perceba ao menos que o futebol não são vinte e dois malucos atrás de uma bola. Confesso que quando ouço essa frase fico a pensar no epíteto mais adequado para aquelas que, mesmo a olhar para um jogo e futebol, não conseguem perceber que nele não andam vinte e dois jogadores a correr atrás da bola, mas sim duas equipas compostas por onze jogadores que procuram, cooperando, fazer chegar a bola a um determinado objectivo.

Já agora, que epíteto recomendam?


sábado, 5 de junho de 2010

AS MULHERES QUE AMARAM MR. KING

(Continuação)

Em 1992, Mr. King regressa a Portugal para dirigir o Benfica-Sparta de Praga. Eis as suas afirmações:

«O valor dos presentes que me enviaram excedeu em muito o limite de 40 libras [cerca de 10 contos] a que estamos autorizados. Fui almoçar com o delegado da UEFA e esse encontro, que era, simultaneamente, o Presidente do Comité de Arbitragem da UEFA, que ao ver as prendas que eu recebera disse imediatamente: Claro que concordei, mas a arbitragem do dia seguinte não deu margem para reparos. Não lhes falei, no entanto, na rapariga que esteve comigo na noite anterior. Ela não me pediu dinheiro e eu, como é natural, nada lhe ofereci.»

Os italianos, de acordo com Howard King, são bem conhecidos pelo seu hábito de rodear os árbitros de atenções. Alguns pormenores em redor do Juventus-Liege de 1991:

«Sabia que a Juventus estava ameaçada de expulsão das talas europeias devido às suas atitudes generosas para com os árbitros. E foi em Itália que esteve próxima a ocasião de receber uma oferta e dinheiro. Fui abordado por alguém que segundo me pareceu, nada tinha a ver com o clube italiano. falou-me da importância do jogo e dos valores que estavam envolvidos numa competição de tal nível. Indicou-me que poderia haver muito dinheiro para mim. Mas jamais viveria em paz comigo se aceitasse a oferta que me foi sugerida. Ele, contrariado, disse: <> Concordei, até porque sei que um colega inglês foi compensado com uma ville e determinada soma em dinheiro depois de uma eliminatória resolvida à custa de decisões controversas»

A entrevista de Howard King ao News of the World não escapou à atenção das organizações que dirigem o futebol. O jornal em questão já fez a entrega de diversos elementos como prova daqquilo que Mr. King declarou. Tanto a FIFA, como a UEFA, parecem preparadas para realizar investigações profundas quanto ao mundo viciado das ofertas de serviços femininos, prática habitual segundo King, entre os principais clubes europeus.

AS MULHERES QUE AMARAM MR. KING

(continuação)

«O corpo dela era belíssimo!, a saia era curta, vi que usava calcinhas brancas e cintos-de-ligas. Quando chegámos ao hotel abraçou-me gentilmente e começámos a despir-nos E disse-me enquanto fazia carícias nos ouvidos: Sabia perfeitamente que eu seria o árbitro do encontro do da seguinte.»

Alexander mostra-se estupefacto, mas o árbitro acrescenta:

«Passámos uma grande noite! Era meu hábito deitar-me pelo menos três horas antes dos jogos importantes e nesse dia, garanto-lhe, essas três horas foram absolutamente essenciais. E não me ofereceram só a rapariga, tive prendas em quantidade!»

Isto foi em 1984. O Sporting venceu por 2-0. O árbitro inglês jura a pés juntos que não favoreceu nenhum dos clubes intervenientes. Disse ainda que, depois do jogo, um delegado do D. Minsk entrou na cabina para entregar-lhe um presente mas encontrou-o abraçado a um antigo amigo português, um dirigente federativo. «As coisas em Lisboa eram boas em demasia!» E a entrevista do News of the World ganha um estilo sensacionalista:

«A UEFA sabe perfeitamente o que se passa quanto a hospitalidades de quarto de cama mas nada faz para o impedir. Enviaram-me prostitutas em quase todos os países que arbitrei: na Rússia, Alemanha, Portugal, Holanda, Espanha e Dinamarca. Entre 1983 e 1993 arbitrei jogos que envolviam clubes como Barcelona, Benfica, Sporting, Ajax, PSV, Hamburgo ou Bayern. Mandaram-me mulheres para os quartos em, pelo menos, 12 ou 15 ocasiões. Tratava-se de raparigas na casa dos 20 anos, quase sempre belas figuras. Não se comportavam directamente como subornadoras mas sabiam muito bem o papel que estavam a representar e, invariavelmente, diziam saber quem eu era. Isto fazia parte de um método que os clubes utilizam na esperança de ganhar vantagem e influência.»

Para já, ingleses de fora...

Cuidadosamente, Mr. King salientou que nunca se confrontou com situações similares sempre que arbitrava jogos entre ingleses. E, ironicamente, chegou a exclamar: «Para conseguir uma chávena de chá já era difícil convencê-los!» Mas volta à carga:

«A chuva de presentes no continente é constante! Recebemos, às vezes, presentes fabulosos; cristais, marchandising, coisas no valor de milhares de libras.»

Howard King, cuja carreira terminou em 1994 devido a uma doença e a uma lesão no joelho, arbitrou mais de 500 jogos, dos quais mais de 20 confrontos internacionais. Pelos vistos o seu fraco são as mulheres, como e confirma:

«Nunca disse não a qualquer oferta de mulheres. Adorava que se mostrassem dispostas a todos os favores. Mas não era o único árbitro a receber mulheres. A primeira vez que me ofereceram uma prostituta foi na Bélgica, onde estive em 1983 para um jogo da Taça UEFA. O meu acompanhante, um antigo árbitro da FIFA, sabia como se faziam as coisas. Levou-me a um lugar do outro lado da fronteira com a Holanda, e não teve problemas em oferecer-me a possibilidade de diversões leves.»

Designado para arbitragem de um jogo de qualificação para o Europeu entre a Rússia e a Noruega, Mr. King encontrou em Moscovo a sua mulher fatal.

«Chamava-se Tânia. Durante o banquete, na véspera do jogo, o meu fiscal de linha, Michael, dava-me caneladas constantemente e segredava: Tânia não sabia uma única palavra de inglês. Levou-me para o seu apartamento e passei uma hora de valor fantástico.»

No dia seguinte a Rússia venceu por 4-0. Mas não precisou de favores do árbitro. A verdade é que , com favores ou sem eles, com Mr. King as equipas da casa venciam sempre.

Entra o Benfica!

(CONTINUA)




AS MULHERES QUE AMARAM MR. KING

Jornal «A Bola» 28 de Novembro de 1995

Londres - A entrevista publicada no jornal dominical inglês News of the World com o ex-árbitro internacional Howard King, porque envolve o nome de dois dos maiores clubes portugueses, entre outros países diversos, é um texto do mais estranho carácter e merece ser observado com alguma atenção. Sabemos que o jornal em questão é dos mais oportunistas deste país; o seu sensacionalismo e a natureza do material de que faz uso tem-lhe roubado respeitabilidade ao longo dos anos, mas até agora ninguém saiu a terreiro com qualquer desmentido quanto às acusações publicadas.
Howard King, com 49 anos, era um árbitro de categoria. Costumava ser designado para os grandes choques entre os mais importantes clubes ingleses e entre os principais da Europa nas competições da UEFA. A sua primeira declaração ao referido semanário é esta:
«Quando precisava de uma rapariga dirigia-me a intermediários dos representantes do clube que me parecia mais vulnerável e dizia-lhes: »
Esclarecedor não é?
«Temos de vencer amanhã, Mr. King!»
Estas exigências, segundo Mr. King revelou ao News of the World, só tinham lugar quando os jogos que ia arbitrar envolviam clubes do continente. Uma das mais escandalosas propostas q recebeu verificou-se em Lisboa, antes de um importante encontro entre o Sporting e o D. Minsk. Confessa King:
«Nessa noite levaram-me a um clube, em Lisboa, onde se encontravam muitas raparigas das mais belas e bonitas. O fulano que me acompanhava disse: Respondi que não compreendia o que aquilo significava, mas ele esclareceu: E eu, claro! Escolhi uma loira, alta, a mais bela mulher que vi em toda a minha vida.»
E prossegue, deste modo mais erótico, as declarações a Peter Alexander, jornalista do semanário britânico.
...
Curiosos? Não percam a continuação...

sexta-feira, 4 de junho de 2010

A FRUTA DO MR. KING

Motivo pessoal muito ponderoso e absolutamente prioritário em relação a tudo afastou-me durante longo tempo deste meu espaço virtual.

Volto hoje para dar continuidade ao texto que iniciei na última entrada, uma vez que as razões que me levaram a escrevê-lo são, ainda hoje, pertinentes, pois muitos são aqueles que continuam a saga de estigmatizar, diminuir, desprestigiar e depreciar os longos anos de vitórias do Futebol Clube do Porto. Servem-se, para tal, de escutas devidamente «trabalhadas» - porque muito diferentes das verdadeiras e completas escutas transcritas nas decisões judiciais - que entretanto foram tornadas públicas das mais variadas formas, sendo as mesmas profusamente comentadas pelos mais diversos opinadores.

Todavia, as decisões proferidas por juízes de Direito, com a força da argumentação e do raciocínio lógico, destruíram, parece-me ate com alguma ironia, as acusações «elaboradas».

Mas parece que tal não foi suficiente. A justiça, em que todos acreditavam no princípio do pocesso e depositavam grandes esperanças, agora já não presta; apenas porque não decidiu em função do que se pretendia. Por isso, ainda hoje, há quem continue a tentar «sarar» as suas frustrações com a constante alusão à «fruta», como se houvesse uma superioridade moral e ética na conquista de títulos desportivos de outros em relação ao Futebol Clube do Porto.

Assim sendo, limito-me a publicar uma notícia publicada no jornal «A Bola» de 28 de Novembro de 1995. Sei que são muitos anos e a memória é curta.

Creio que, no final da transcrição que farei, talvez alguns venham a pensar: «A cada um a sua fruta... Cada um nos seus pomares.»

Aproveito para repetir a primeira frase da notícia, se tal não for muito incómodo...

UM EX-ÁRBITRO INTERNACIONAL FALOU ABERTAMENTE DA OFERTA DE PROSTITUTAS POR CLUBES EUROPEUS, ENTRE OS QUAIS SPORTING E BENFICA

quarta-feira, 31 de março de 2010

A FRUTA



Bastou Pinto da Costa dar uma entrevista a Judite de Sousa para surgir logo aqui pela internet em tudo o que é comentário as alusões à fruta e ao café com leite. Nada que surpreenda. Essa tem sido, aliás, a única forma que muitos encontram para, num acto terapêutico, aliviarem o peso de anos e anos de derrotas e frustrações.

Se não houvesse esta desculpa dos benefícios dos árbitros, como seria a dor da comiseração de tantos anos de insucessos? Se assim não fosse... ainda se suicidavam.

Na verdade, é muito mais fácil ler e ouvir escutas meticulosamente seleccionadas com o intuito de visarem e denegrirem o pesidente do Futebol Clube do Porto, do que ler cuidadosamente todas as páginas das sentenças dos tribunais onde, aí sim, a escuta é transcrita na sua totalidade e onde fica também claramente demonstrado o depoimento ficcionado de uma escritora. Mas isso, para além de muito trabalho, não interessa para o que se pretende. E cansa muito a cabeça e esta já está massacrada por muitos anos de derrotas.

Nos últimos quatro campeonatos que o Futebol Clube do Porto conquistou, o slb nem sequer a segunda posição conseguiu. Já para não lembrar o célebre sexto lugar precisamente no ano em que o Boavista foi campeão.

É por isso que, ao considerar essa função catártica do discurso da fruta e das escutas, nem tenho dito nada. Mas sinceramente... já cansa. Isso já devia estar resolvido. Há muitos profissionais por aí que certamente resolveriam este problema.

Assim sendo, talvez a resolução passe por dar a conhecer, ou lembrar, outros pomares. E é isso que vou fazer durante uns dias transcrevendo uma notícia publicada na dita «bíblia» do jornalismo desportivo português, no dia 28 de Novembro de 1995.

O título da mesma foi o seguinte: «As mulheres que amaram Mr. King»
O subtítulo? Este:
UM EX-ÁRBITRO INTERNACIONAL FALOU ABERTAMENTE DA OFERTA DE PROSTITUTAS POR CLUBES EUROPEUS, ENTRE OS QUAIS SPORTING E BENFICA.
Curiosos? Não percam as próximas entradas do meu blogue.

terça-feira, 30 de março de 2010

A PAIXÃO DE CRISTO


O trabalho não me tem deixado vir aqui «respirar» um pouco. Vim agora, e de imediato, porque se iniciou na RTP 2 uma série de seis episódios que vão apresentar o filme A Paixão de Cristo, realizado por Mel Gibson.

Um filme que aconselho. Bem sei que é idêntico a outros. Mas este relata as últimas doze horas da vida de Jesus Cristo até à sua crucificação e evidencia de forma dramática a dimensão do seu sofrimento.

Nesta altura do nosso calendário, seria importante uma reflexão sobre o sentido que a Páscoa deveria assumir em nós. Qual o sentido que lhe atribuí?

sexta-feira, 19 de março de 2010

LIBERDADE



Ai que prazer
não cumprir um dever,
ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada
estudar é nada.
O sol doira
sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa,
de tão naturalmente matinal,
como tem tempo, não tem pressa…
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
a distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças…
Mas o melhor do mundo são as crianças,
flores, música, o luar e o sol, que peca
só quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto
é Jesus Cristo
que não sabia nada de finanças
nem consta que tivesse biblioteca…

Fernando Pessoa

quinta-feira, 11 de março de 2010

TEMPO



O tempo é inexorável. Minuto a minuto, hora a hora, ele avança.O tempo existe. Mas existe a percepção e a experiência do tempo. Basta para isso pensar que a nossa concepção de tempo linear não é a única do mundo. Outras sociedades têm uma concepção cíclica do tempo e portanto uma percepção diferente do mesmo.

Estou por isso convicto de que muitas vezes não é a passagem dele pelas nossas vidas que nos atormenta, mas a opinião e atitude perante o mesmo que nos leva a envelhecer mais. Para que possamos ter a maturidade sem a pagar com a idade, teremos que ter a atitude adequada para com o tempo.

É inevitável. A Biologia não falha e por isso o envelhecimento do nosso corpo é inevitável. Porém, podemos envelhecer para a vida e não envelhecer da vida. A idade é também um estado de espírito. E esse podemos tentar renovar. Tenho que pensar nisso, porque dos meus cabelos brancos não me importo. Para finalizar, deixo-vos um belo texto escrito pelo Rei Salomão que, na sua infinita sabedoria, pensou assim o tempo e escreveu as suas considerações acerca do mesmo no terceiro capítulo do livro de Eclesiastes.

Tudo tem o seu tempo determinado
e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.
Há tempo de nascer, e tempo de morrer;
tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;
tempo de matar, e tempo de curar;
tempo de derrubar, e tempo de edificar;
tempo de chorar, e tempo de rir;
tempo de prantear, e tempo de dançar;
tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras;
tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;
tempo de buscar, e tempo de perder;
tempo de guardar, e tempo de lançar fora;
tempo de rasgar, e tempo de coser;
tempo de estar calado, e tempo de falar;
tempo de amar, e tempo de odiar;
tempo de guerra, e tempo de paz.
Que proveito tem o trabalhador naquilo em que trabalha?
Tenho visto o trabalho que Deus deu aos filhos dos homens, para com ele os exercitar.
Tudo fez formoso em seu tempo; também pôs o mundo no coração do homem,
sem que este possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até ao fim.
Já tenho entendido que não há coisa melhor para eles do que alegrar-se e fazer bem na sua vida. E também que todo o homem coma e beba, e goze do bem de todo o seu trabalho;
isto é um dom de Deus.
Eu sei que tudo quanto Deus faz durará eternamente;
nada se lhe deve acrescentar, e nada se lhe deve tirar;
e isto faz Deus para que haja temor diante dele.
O que é, já foi; e o que há de ser, também já foi;
e Deus pede conta do que passou.
Vi mais debaixo do sol que no lugar do juízo havia impiedade,
e no lugar da justiça havia iniquidade.
Eu disse no meu coração: Deus julgará o justo e o ímpio;
porque há um tempo para todo o propósito e para toda a obra.

sábado, 6 de março de 2010

NÃO TEMOS CULTURA DE ADEPTO DE FUTEBOL


O jogo entre as selecções nacionais de Portugal e da China foi mais uma tristíssima demonstração da falta de um cultura de adepto de futebol em Portugal. Considero inaceitável que uma selecção nacional portuguesa, a jogar no seu próprio país, possa ser apupada; ou pior; mesmo brindada com a entoação de olés por parte de um público que, supostamente, a deveria apoiar em todas as circunstâncias.

Nunca gostei dos olés. Nem sequer nas touradas e muito menos nos estádios de futebol. Entendo que os mesmos são indignos e desrespeitam o esforço dos jogadores de uma equipa, seja ela qual for, sem a qual não seria possível realizar o jogo a que as pessoas assistem. Por maioria de razão, tal comportamento é completamente inadmissível quando visa a equipa que pretendíamos apoiar inicialmente.

Muitos dos portugueses que se deslocam aos estádios de futebol para verem os jogos permanecem nos mesmos numa dualidade não resolvida. Se apenas pretendem assistir a um bom espectáculo de futebol, sejam coerentes no comportamento e aplaudam ambas as equipas e seus jogadores sempre que o desempenho destes é merecedor.

Porém, a condição de adepto pressupõe um comportamento tendente a apoiar uma equipa. Não creio que apupar o desempenho da equipa da nossa predilecção possa constituir um grande apoio à mesma. Muito menos a humilhação dos seus jogadores através de olés.

É muito fácil exultar e apoiar quando a equipa com a qual nos identificamos está a ganhar. Mas é quando esta está a perder que mais necessita do apoio dos seus adeptos. É quando a vida nos é adversa que mais necessitamos de ajuda. Este é mais fácil dispensar quando tudo nos corre bem.

Em Portugal, e passada a euforia dos primeiros minutos de jogo, a tensão e as dificuldades inerentes ao mesmo emudece muitas vezes os adeptos e estes passam a actuar por reacção e não tanto por acção de apoio. Muitas vezes, é a equipa que puxa pelos adeptos e não o que seria de esperar, ou seja, os adeptos a puxar pela equipa. Quando as exibições são pobres e/ou os resultados adversos, nega-se a condição de adepto e surgem mesmo os assobios e os apupos. É a esperança perdida. É a equipa com a qual nos identificamos projectivamente esperando que vença por nós que nos defrauda. Compreende-se, mas não se aceita. Sobretudo porque prejudica a equipa que inicialmente se pretendia apoiar.

Bem sei que esta é uma generalização, quicá abusiva, do que se passa com os adeptos de futebol em Portugal. Todavia, os vários anos de presença regular nos estádios de futebol portugueses e de observação do comportamento dos adeptos portugueses criou em mim a convicção que temo muitos adeptos de festas. Esta é a denominação que atribuo a muitos que comparecem apenas nos períodos de sucesso das equipas ou mesmo somente no dia em que a vitória se concretiza, lotando então, nesses dias, os estádios. No dia da festa é fácil. Tudo está feito e é só lançar os foguetes.

No entanto, quando é preciso suportar a chuva e o frio, sofrer quando a equipa perde, percorrer largos quilómetros e gastar verbas avultadas para apoiar a equipa, estão presentes apenas o verdadeiros adeptos. E desses... não há muitos.

quarta-feira, 3 de março de 2010

PARABÉNS MANCHA NEGRA


Hoje pretendo deixar aqui uma saudação especial à claque Mancha Negra, pois este grupo faz 25 anos. Esta, como outras claques, são a prova que acabam mais depressa alguns dirigentes desportivos e até clubes do que propriamente as claques. Por mais que queiram acabar com elas.

A Mancha Negra é também a prova de como é estulta a generalização gratuita que muitos fazem acerca das claques. Eu sei que já se iniciou o julgamento de membros dos No Name Boys. Conheço também a gravidade dos crimes de que os arguidos estão acusados. Já em 1999 questionei mesmo o recurso ao termo Claque para designar os No Name Boys. Os próprios excluem-se do Movimento Ultra. Estão longe de serem representativos do que são as claques em Portugal.

O julgamento que agora se efectua vai precisamente no sentido da responsabilização objectiva e individual. Foi o que sempre defendi. Aqueles que no seio das claques ou a coberto destas perpetram crimes devem ser punidos pelos seus actos; para que tal castigo sirva de exemplo aos outros e funcione como efeito dissuasor. Assim se afastarão aqueles que devem ser afastados, até para benefício das próprias claques.

Ao invés, outros optam por tomar a nuvem por Juno e não distinguem o trigo do joio. Consequentemente, atiram «lama» sobre todos os membros de todas as claques. Classificam assim tudo e todos por actos que apenas uma minoria pratica. Como se as claques fossem todas iguais e, por maioria de razão, todos os membros de cada claque fossem também todas iguais. Como se sentiriam aqueles que desqualificam a generalidade das claques e seus membros se, sobre todos os que pertencem à classe profissional em que se inserem, fossem generalizados os crimes que apenas uma minoria dos que a ela pertence cometeu?

Este discurso pobre, ignorante, redutor e de generalização fácil estigmatiza e tem o efeito perverso de concorrer para a promoção do que se critica. Em consequência do mesmo, e para não sofrerem com tais classificações e etiquetas, alguns membros das claque abandonam os grupos evitando conotar-se com as mesmas aos olhos da opinião pública, do patrão ou até dos professores. Encontrei vários casos desses na minha investigação. Ao invés, uma imagem tão negativa das claques constitui para muitos a motivação para as integrar e prossseguir e reproduzir no seio destas, sob a ilusão do anonimato, uma carreira de delinquência já presente no quotidiano.

No entanto, parece que ninguém se interroga a este respeito. Opta-se por leis que algumas claques fingem cumprir. Por sua vez, as entidades responsáveis pela sua verificação fingem que as mesmas estão a ser cumpridas, nem que seja apenas uma parte. Outros pontos da lei permanecem letra morta, mas com esses ninguém se importa. Mais tarde alguém cá estará para enfrentar os efeitos perversos da legislação, bem mais gravosos do que os problemas actuais. Os primeiros sinais já estão aí, mas isso não é problema. Relativamente às claques todos têm já soluções para tudo, mesmo que estas criem mais problemas - e mais graves - do que aqueles que já existem.

Reitero as minhas felicitações à Mancha Negra pelo seu aniversário e pela opção legal tomada.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

TOM WAITS


Ok.

Vou então acrescentar algo mais sobre António Pinho Vargas, sobretudo acerca da sua música intitulada Tom Waits.

Recordo-me bem da explicação que este músico portuense deu para esta sua criação e seu respectivo título em entrevista a António Macedo, hoje locutor da RDP Antena 1. Provocado por este profissional da rádio com a expressão «Tom Waits é lá de outras vidas!!!», António Pinho Vargas afirmou então, em entrevista filmada durante uma viagem de comboio, que a música foi criada em consequência da audição que fez de um disco de Tom Waits que lhe tinha sido oferecido por Rui Veloso. Para além da evidente voz rouca de Tom Waits que denotava talvez bastantes copos de bagaço - António Macedo interrompeu para afirmar «Eu digo que é de carrascão» - Pinho Vargas vislumbrou muita ternura, procurando então, com a música que criou, expressar e evidenciar tal sentimento.

Eu acho que conseguiu, deixando-nos uma das suas mais belas composições. O título, como disse o músico, foi «uma espécie de homenagem».

Partilho aqui convosco duas versões. A primeira resulta do próprio documentário intitulada Deixem Passar a Música, onde a entrevista a que me reportei foi apresentada.

http://www.youtube.com/watch?v=8w5rYHmk38o

Esta segunda é uma versão mais recente, a solo. Ouçam e apreciem.




sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

À BEIRA DE ÁGUA



Prometo que responderei a algumas solicitações no sentido de escrever mais um pouco sobre António Pinho Vargas.

Hoje, ou melhor, nesta data, volto a sentir o que é A Persistência da Memória. Sobre ela já aqui deixei algumas linhas, deixando também uma imagem do quadro de Salvador Dali que recebeu tal título.

Na passada quarta-feira, pela manhã, e durante a aula de Comunicação Intercultural, falei um pouco sobre Eliade e a noção do eterno retorno. É por um eterno retorno que chegamos aos momentos originais e os reactualizamos, por rituais, na nossa memória, sobretudo quando esta parece perder-se. Como escreveu Paul Connerton, é assim que as sociedades recordam.

O dia de hoje tem, porém, uma lógica contrária. Sobre esta data, e sobretudo pelo que evoca, digo o mesmo que David Mourão Ferreira escreveu sobre a cidade em que nasceu - «Dela por vezes me evado mas sempre a ela regresso. Bem sei eu que não desato os cordões com que me aperta»

Eu sei que não perceberam, por minha culpa, o que pretendo dizer. Mas as palavras são assim. Por vezes, têm o seu lado poético e este nem sempre é decifrável, porque intimista.

É, pois, em exaltação desse lado, que aqui compartilho um poema do saudoso Eugénio de Andrade.




À BEIRA DE ÁGUA


Estive sempre sentado nesta pedra
escutando, por assim dizer, o silêncio.
Ou no lago cair um fiozinho de água.
O lago é o tanque daquela idade
em que não tinha o coração
magoado. (Porque o amor, perdoa dizê-lo,
dói tanto! Todo o amor. Até o nosso,
tão feito de privação.) Estou onde
sempre estive: à beira de ser água.
Envelhecendo no rumor da bica
por onde corre apenas o silêncio.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

DANÇA DOS PÁSSAROS


Ainda em Lisboa, no final do primeiro dia do congresso Sports & Diaspora, fui jantar a um restaurante do qual guardo boas memórias e que se situa no Centro Comercial Amoreiras. Ao chegar a este, deparei-me com uma fachada do edfício cuja imagem todos pudemos ver numa telenovela portuguesa. Tal fachada fez-me recordar uma bela música de António Pinho Vargas. Na época, a Dança dos Pássaros foi um grande sucesso deste compositor da cidade do Porto.

António Pinho Vargas é hoje um dos grandes compositores da música portuguesa. A beleza da sua obra mantém-se em cada novo trabalho e a sua música paira no ar em muitos momentos do meu quotidiano. Esteve soberbo - como sempre - na última vez que o ouvi. Foi em S. João da Madeira e lá tive que aguentar uma viagem de dezenas de quilómetros debaixo de intensa chuva. Mas valeu a pena. Vale sempre a pena ouvi-lo. É um nome grande da cultura portuguesa.

E não se esqueçam. É um grande portista.

Aproveito, pois, esta oportunidade para partilhar convosco a Dança dos Pássaros; uma música que sempre está na minha memória.


Mas muitas outras músicas inesquecíveis ele tem. Bastaria apenas lembrar Tom Waits. Sobre esta, Pedro Burmester afirmou que se tal música tivesse surgido nos Estados Unidos da América, Pinho Vargas estaria rico.
Ainda bem que é de Portugal

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

GOSTO DE COMBOIOS


Sim. Gosto de comboios e recordei com alguma saudade tal gosto na passada sexta-feira quando viajei no Alfa Pendular para Lisboa.

Recordo o cheiro das estações de comboios e a sua tranquilidade e silêncio, sempre interrompido pela passagem dos comboios e pela agitação da entrada e saída dos passageiros. Lembram-se das antigas bilheteiras com aquela máquina grande de obliterar a data naqueles coloridos bilhetes de cartão? Guardei muitos após cada viagem que fazia entre a estação de S. Bento, no Porto, e a estação de Esmoriz. E a arquitectura das estações portuguesas, sempre com belos azulejos e jardins bem arranjados, que eram mesmo razão de competição entre as estações em concursos nacionais? E que dizer daquela celebre palavra (também composta em azulejo) «RETRETES» que muitos sorrisos motivava? Sim, porque, com aquelas condições, eram de facto retretes.

Eu ainda cheguei a viajar nas velhas carruagens puxadas pela máquina a carvão. Lembro-me perfeitamente dessa viagem à Povoa do Varzim, promovida pelos meus avós maternos que assim corresponderam ao meu pedido para experimentar esses comboios.

Recordo também com saudade as conversas com o Sr. Victor Hugo (Chefe da Estação de Esmoriz) e com o Sr. Catarino (Chefe da Estação de S.Bento). Ambos suportavam estoicamente as minhas perguntas sobre comboios e respondiam a todas com o maior gosto. Aprendi muito com eles.

Gosto de comboios. Mas não é do Alfa que eu gosto. Há mesmo certas coisas que não consigo perceber. Fui confrontado com mais um aumento de preço, precisamente quando a qualidade das carruagens vai-se degradando. No W.C já não temos os mesmos adereços de higiene que outrora estavam disponíveis. Os preços praticados no bar são proibitivo e não é a simpatia das meninas que servem (sempre muito bem-vinda e que se mantenha) que paga a conta. Quando olho para a tabela de preços lembro-me sempre da justificação que muitos membros das claques apresentam para os furtos que praticam nas áreas de serviço das auto-estradas. Ainda que a mesma seja para mim inaceitável e tais actos inadmissíveis, confesso que não deixo de me recordar da célebre frase: «com aqueles preços merecem ser roubados.»

Para além disso, o Alfa Pendular tem as vantagens e as desvantagens da ausência de um ambiente «popular». Temos nele o silêncio e a tranquilidade para ler, trabalhar ou até dormir. Muitos trabalham mesmo no computador como se, a partir de um comboio, controlassem o mundo. O que é certo, é que já viajei ao lado de alguém que comprou e vendeu acções via Internet em várias bolsas do mundo durante a viagem para o Porto. E lá me foi explicando como tais operações bolsistas funcionavam. Todavia, no Alfa Pendular temos poucas possibilidades de ouvir conversas divertidas e nem sequer o pregão da senhora que ainda vende, no Intercidades, os pastéis de Tentúgal e as Tigeladas.

Reconheço que houve um esforço de promoção do comboio, até pelo facto deste transporte ser «amigo» do ambiente. Reconheço também que, de uma forma geral, há um pouco mais de conforto nos comboios actuais, embora, em alguns suburbanos, quem necessitar de WC terá certamente que usar o próprio bolso. De qualquer forma, em cada viagem de comboio que faço, mesmo no Alfa Pendular, recordo o meu gosto pelos comboios. Com o som compassado dos rodados de cada carruagem passando pelos trilhos vem sempre a recordação da ODE À POESIA. Um poema de Miguel Torga que não esqueço e aqui compartilho.

Vou de comboio...
Vou mecanizado e duro como sou neste dia;
E mesmo assim tu vens, tu me visitas!
Tu ranges nestes ferros e palpitas
Dentro de mim, Poesia!
Vão homens a meu lado distraídos
Da sua condição de almas penadas;
Vão outros à janela, diluídos
Nas paisagens passadas...
E porque hei-de ter eu nos meus sentidos
As tuas formas brancas e aladas?
Os campos, imprecisos, nos meus olhos,
Vão de braços abertos às montanhas;
O mar protesta contra não sei quê;
E eu, movido por ti, por tuas manhas,
A sonhar um painel que se não vê!
Porque me tocas?
Porque me destinas
Este cilício vivo de cantar?
Porque hei-de eu padecer e ter matinas
Sem sequer acordar?
Porque há-de a tua voz chamar a estrela
Onde descansa e dorme a minha lira?
Que razão te dei eu
Para que a um gesto teu
A harmonia me fira?
Poeta sou e a ti me escravizei,
Incapaz de fugir ao meu destino.
Mas, se todo me dei,
Porque não há-de haver na tua lei
O lugar do menino
Que a fazer versos e a crescer fiquei?
Tanto me apetecia agora ser
Alguém que não cantasse nem sentisse!
Alguém que visse padecer,
E não visse...
Alguém que fosse pelo dia fora
Neutro como um rapaz
Que come e bebe a cada hora
Sem saber o que faz...
Alguém que não tivesse sentimentos,
Pressentimentos,
E coisas de escrever e de exprimir...
Alguém que se deitasse
No banco mais comprido que vagasse,
E pudesse dormir...
Mas eu sei que não posso.
Sei que sou todo vosso,
Ritmos, imagens, emoções!
Sei que serve quem ama,
E que eu jurei amor à minha dama,
À mágica senhora das paixões.
Musa bela, terrível e sagrada,
Imaculada Deusa do condão:Aqui vou de longada;
Mas aqui estou, e aqui serás louvada,
Se aqui mesmo me obriga a tua mão!